…vai fundo
o significado da despedida
não mais volta
nem ida
ao por do sol.
Delineia-se altivo
o definitivo
o fim da linha
Copyright©2024 Maria Brockerhoff
…vai fundo
o significado da despedida
não mais volta
nem ida
ao por do sol.
Delineia-se altivo
o definitivo
o fim da linha
Copyright©2024 Maria Brockerhoff
…no livro da vida
as páginas do tempo nos aguardam
cheias de mistérios.
As páginas e o tempo
estão disponíveis
para os desejos
à espera
de impulsos
da ousadia de transgredir
da capacidade de ultrapassar.
As páginas
assim como todos os dias
serão preenchidos com seiva
lágrimas suor força…
cada um de nós usará a tinta das veias
para colorir umas e
outros…
Copyright©2001 Maria Brockerhoff
Em 2014 as Erínias captaram a linguagem eloquente da foto do jovem príncipe… hoje, com o seu grito de liberdade, confirmou-se a intuição certeira do poema…
Caiu um príncipe
no buraco fundo
da copa do mundo.
O elegante rapaz
atraiu muita gente
batedores, holofote.
Teve brilho fugaz
o nobre filhote.
Cercado de menina
de mídia cretina
certamente o pobre Harry
trocaria a própria sina
— do pé à medula —
pela alegria simples
do moleque-gandula…
Copyright©2014 Maria Brockerhoff
Estou acanhado, nem sei por onde pegar este assunto sucinto:
um solerte advogado, possivelmente de pasta preta, não sei, indo ao Forum da Justiça Federal no Rio para cuidar de processos, topou pela frente com determinada funcionária, cujos seios saltavam aos olhos.
Faço aqui um parêntese: vejam como a língua brasileira é safada. Quando escrevo que os seios saltavam aos olhos quero dizer os olhos é que pularam para os seios, visto que estes não saltam, pois a natureza os fez presos e seguros. Ao mesmo tempo, quero significar que os seios eram vistosos.
Entendido?
Fechar o parêntese.
Que faz o advogado? Em vez de requerer em juízo a juntada aos autos, conforme determina a boa processualística, quis fazer justiça pelas próprias mãos e agarrou-os (os seios), presa de incontida emoção, num arroubo que, francamente, só se entende perante jurados.
Não sei como qualificar o gesto.
Atentado violento ao pudor?
Apropriação indébita?
Tentativa de seqüestro?
Sei apenas que a funcionária, embora pública, teve bons motivos privados para protestar, e o fez, numa representação ao diretor do Forum.
Formou-se o processo, e imagino sua finura. Deve ter dado um romance, este opinando assim, aquele opinando assado, um outro pedindo que se ouvissem as testemunhas; enfim, essas coisas todas que a justiça é obrigada a suportar todos os dias.
Corria a coisa na órbita federal, até que os seios foram parar nas mãos do Tribunal Federal de Recursos, que não sabia onde botar aquilo. Reúnem-se os juízes, atarantados. Mexe daqui, mexe de lá, verifica-se que não há jurisprudência firmada sobre o assunto.
O que faz o Tribunal? Lava as mãos, sob a alegação de que a Justiça Comum é que deve cuidar do caso — da mesma forma como trataria, digamos, dos seios de uma comerciária, de uma fazendeira, de uma operária.
O entendimento do Tribunal Federal de Recursos é bastante claro:
“Quem se descontrola perante a beleza estética de uma funcionária pública federal e lhe agarra os seios não comete nenhum crime que deva ser apurado pela Justiça Federal, mas sim pela Justiça Comum dos Estados. Os seios da funcionária não são próprios da administração pública, nem quem os toca comete uma infração ao exercício normal da função.”
Decisão exemplar.
Vejam bem que não se trata aqui de permitir aos advogados o descontrole perante a beleza estética, isso não, pois haveria uma corrida aos cursos jurídicos, que já abundam, em busca de tão esdrúxulo privilégio. Amanhã estaria a enorme população de beca e capelo trocando os pés pelas mãos.
Em absoluto. Continua terminantemente proibido bulir nos seios no recinto do Forum, dentro ou fora do expediente. Este é o ponto que deve ficar bem claro: os infratores serão julgados pela Justiça Comum.
De outra parte, fica-se sabendo que não há seios federais.
Todos os seios são estaduais. E não são próprios da administração.
Cada funcionária deve, pois, administrar o que lhe pertence de direito. De resto, os seios não são públicos; antes, estão subordinados à iniciativa privada, que se encarregará de resguardá-los e defendê-los na medida das necessidades.
Que cada um saiba, pois, onde os deixa e onde bota a mão.
O Tribunal Federal de Recursos manifestou-se com sensatez. Provou, mais uma vez, que a Justiça é mulher experiente e de peito. O erro foi do advogado: acreditou naquela história de que a Justiça é cega.
No Forum, tudo se sabe, doutor.
Crónica de Lourenço Diaféria, 11/1976,
coletada em “Circo dos Cavalões”.
Caiu um príncipe
no buraco fundo
da copa do mundo.
O elegante rapaz
atraiu muita gente
batedores, holofote.
Teve brilho fugaz
o nobre filhote.
Cercado de menina
de mídia cretina
certamente o pobre Harry
trocaria a própria sina
— do pé à medula —
pela alegria simples
do moleque gandula…
Copyright©2014 Maria Brockerhoff
(A imagem inferior é da praia de San Diego (USA) em 2007, após a festa de 4 de Julho; não foi possível localizar o autor da combinação com as outras imagens.)
Veja, também: Movimento Nossa BH e Brasil, um Grande Lixão.
É desanimador o resultado da celebração do reveillon. As pessoas saem às ruas para a festa de passagem do ano, bem vestidas, confraternizam-se, fazem planos e projetos, têm alegres expectativas… e o saldo em 2014? Centenas de toneladas de lixo nas ruas, praias e praças!
O Estadão, em maio/2013, publicou os dados alarmantes: as cidades brasileiras não cuidam do lixo. Por ano, são 168 (!) estádios do porte do Maracanã cheios de lixo despejados em condições impróprias, em lugares inadequados.
Em 1876 o francês Aleixo Gary criou o serviço de limpeza de rua no Rio de Janeiro, que só mais tarde passou para a administração municipal. Os coletores de lixo foram denominados “garis” em homenagem a este visionário, que não ficaria nem um pouco satisfeito ao constatar a situação do lixo no Brasil. Mais de um século depois, a cidade do Rio de Janeiro está em 9º lugar entre as 20 cidades mais sujas do mundo. Mais de um século depois, nós brasileiros não conseguimos fazer o ato mais simples, rudimentar, primário e elementar da civilização: colocar o lixo no lixo.
A consequência deste comportamento leva à irrespondível dúvida: se não conseguimos compreender e executar este ato básico, seremos capazes de exercer a cidadania? Haverá possibilidade de o povo brasileiro se desenvolver dignamente?
O primeiro sinal do grau de cultura e civilidade de um povo é a limpeza dos espaços públicos. Tóquio está em primeiro lugar na lista das cidades mais limpas do mundo. Vimos lá grupo de pessoas recolhendo, se houver, um mínimo de lixo às margens do rio, nas ruas e praças. Isto é uma rotina das famílias japonesas. Vimos, pela manhã, os proprietários de lojas e restaurantes limpando a poeira da porta de seus estabelecimentos. Aqui, “neste país”, quando alguém varre as calçadas, joga o lixo na rua, nos bueiros.
Nas copas do mundo de futebol, as equipes de limpeza entram nos estádios imediatamente após os jogos para recolher o lixo. Em 2006, na Alemanha, os garis tiveram uma grande surpresa: no lado da torcida japonesa não havia, sequer, um papelzinho de bala nas arquibancadas. Este fato nos traz uma ínfima e desesperada esperança:
Se outros povos podem, se outros conseguem, por que não os brasileiros?
Sr. Kalil,
ouvi falar muito do Sr. nestes últimos dias. Foi deveras impressionante e cheguei a sonhar com um concerto oferecido pelo Sr. aos torcedores.
Sim, senhor. Minas Gerais tem renomadas orquestras sinfônica e filarmônica, tem a sinfônica da Polícia Militar, excelentes pianistas, violonistas e outros exímios instrumentistas.
O espetáculo musical do sonho foi uma homenagem cultural aos jogadores e a todos os torcedores mineiros que se deliciaram com as músicas de excelente qualidade. Muitas crianças, muitos idosos tiveram oportunidade — talvez a primeira — de ver os incríveis instrumentos de uma orquestra. Todos tiveram a sensação especial proporcionada por este tipo de entretenimento: a vivência de uma genuína alegria e encantamento. Mas, não se assuste, foi um sonho apenas. A realidade é bem outra!
Nesta situação, o senhor parece-me uma pessoa muito importante; é capaz de mobilizar centenas de milhares de pessoas, levá-las à rua, acompanhadas de contínuos foguetórios e buzinaços. Muita, muita gente permaneceu em frente à sede do clube por intermináveis horas. Algumas anunciavam, com a voz já enrolada, a volta ao trabalho apenas na segunda-feira seguinte à vitoria do Atlético. Para a maioria, o mais significativo e importante momento de suas vidas.
De quarta a domingo, a massa enlouquecida grita, chora, se embriaga… as famílias se unem “no grito, na raça” dando às crianças o exemplo de uma comemoração. Ainda na quinta-feira, até o começo da tarde, uma multidão, de onde exalava forte cheiro de bebida e xixi, atrapalhava a passagem de veículos e ônibus lotados. As pessoas chegariam atrasadas aos hospitais, às lojas, ao aeroporto, às igrejas, aos escritórios. Porém, tal comemoração não comporta queixas, pois é de máxima importância para um país tão bonito, cujo índice de violência, de analfabetismo, de corrupção é altíssimo! É a justa manifestação da alegria de um povo acostumado a engolir qualquer desaforo, qualquer desmando dos poderosos da vez.
Sr. Kalil, agora certamente pensou em um presente à altura da paixão dos torcedores e um presente sempre revela muito do doador: nesta quinta-feira, 1 de agosto, em um gesto generoso, tal qual um imperador romano, o senhor manda fechar a principal via da cidade de Belo (!) Horizonte e lavar com rios de cerveja o restinho da dignidade dos cidadãos.
Antigamente era pão e circo. Hoje é cerveja e futebol.
Não há pretensão alguma de examinar um tema tão vasto e complexo. Cabem aqui as considerações interessantes do filósofo norueguês Jon Elster, citado por Juan Antonio Rivera, in “O que Sócrates diria a Woody Allen” (2004, Ed. Planeta), sobre a obsessão de certas pessoas com a insônia. Perseguir uma boa noite de sono é receita certa para o inverso:
Jon Elster, com lucidez, compara esta situação com aquela em que perseguimos certos objetivos inatingíveis. Isto porque são subprodutos, assim como a serragem, quando se serra a madeira. A serragem vem gratuitamente e vale muito menos, mas não podemos obtê-la diretamente, como o sono e a felicidade, mesmo se concentrando e colocando todos os cinco sentidos em ação.
O sono, a felicidade, o desejo de se apaixonar, o aumento de auto-estima, o esquecimento de uma perda, entre uma infinidade de estados, não virão através de processos racionais, de metas programadas, de exercícios deliberados… porque tudo de bom nesta vida é de graça: é essencialmente subproduto. Esta “serragem” está ligada ao mais íntimo de nós.
O filósofo e economista inglês do séc.XIX John Stuart Mill já descobrira que a busca da própria felicidade é estéril. A única opção — o pulo do gato — é escolher um outro fim, escolher um outro objetivo como propósito de vida. A partir daí, o subproduto virá de mansinho, sem alarde, em silêncio: aí sim, a “serragem” da felicidade chegou!
Um sonho para Belo Horizonte
Para BH, meu sonho
é simples e tristonho.
De enorme relevância,
e ninguém dá importância.
É óbvio degrau da educação
desprezado e inacessível.
Adivinhou o sonho impossível?
BH sem lixo na rua, na fonte
sem água servida
sem restos de comida
na triste avenida
no feio horizonte.
Este sonho terá saída?
Duvido. Depende somente
tão só, exclusivamente,
de cada cidadão
sem exceção!
Copyright©2014 Maria Brockerhoff