África do Sul – A Rota Jardim

A rodovia — The Garden Route — é um colar de paisagens inesperadas. A N2 corta o sul entre Port Elizabeth e Cidade do Cabo, interligando montanhas, parques, cachoeiras, canyons, praias e cidadinhas.
A Rota Jardim foi habilmente traçada ao pincelar o litoral do Índico com dramáticos recortes de pedra e a renda das ondas.

Aqui, basta deixar-se levar…  nada de guia, de “explicação” de paisagens! Aliás, cada vez mais e, infelizmente, fotos e obras de arte são legendadas; peças de teatro, filmes, etc. são descritos… isto significa ver pelos olhos do outro! Fica-se com uma leitura de segunda mão.
Assim, perde-se o prazer indescritível da surpresa absoluta da primeira vez… aqueles poucos e preciosos segundos de encantamento, antes de qualquer definição em palavras! São momentos inefáveis de emoção antes dos substantivos e adjetivos.

  • A baía de Jeffrey é uma praia de surfistas; a pequena cidade tem ótima estrutura, premiada com altas ondas convidativas. É beleza a perder de vista.
  • Tsitsikamma é um parque muito bem preservado, com passarelas, cortado por canions e abriga a celebrada árvore mais velha da África, belíssima nos seus 1000 anos. Animador ver os filhotes arbustos ao redor. No Tsitsikamma, a foz do Rio Storms forma um conjunto espetacular de canions, florestas e bravas ondas do mar; a soberba ponte pênsil tira o fôlego. Nesta época as águas do Índico ficam avermelhadas devido à proliferação de um tipo de algas… o resultado é inacreditável!
  • Plettenberg, a praia na cidade mais rica da África do Sul. Ironicamente, perto dali, há um grande aglomerado de barracos, moradia dos trabalhadores de hotéis, restaurantes, etc.. Plett — é o apelido — recebe os turistas mais abonados, que podem escolher os mais variados esportes aquáticos. E as casas são hollywoodianas.
  • Knysna — pronuncia-se “naisna” — é a região formado pelo estuário do rio homônimo. O lago Knysna deságua no Oceano Índico e tem belas praias, ilhas, marinas com elegantes iates. A recepção do hotel Belvidere Manor, às margens do lago, é uma antiga fazenda com varandas na parte menor de um retângulo. De cada lado, chalés confortáveis e, no centro, um gramado com gazebo, piscina e jardins que se estendem até o lado. Mesas para o coquetel de ostras — o forte da região — e jantar de boas-vindas à luz das estrelas. Sim, dá pra ouvir e vê-las!
    A cidade de Knysna é uma pequena Veneza. No cais, pode-se encontrar um artesanato finíssimo. A “Porcupine” é uma fábrica de talentos em cerâmica Raku; a “Original Metal Art” é um assombro!
    Antiga mina de ouro/1876, hoje a região é um tesouro para quem curte caminhadas pelas Montanhas Outeniqua e outros prazeres da natureza generosa.

África do Sul – A Rota Jardim #2

Continuando na “Garden Route“:

  • P1090498Wilderness — a rodovia N2 corta a montanha Outeniqua até Wilderness, perto da cidade de George. Wilderness é pequena e serpenteia pelo morro, cheia de cascatas, trilhas e montanhas. As praias são limpíssimas, desertas e a areia cor de neve.
    As águas cristalinas cobrem milhares de caramujos coloridas passeando por ali; um deles, certamente trazido pelas ondas, estava bem longe do mar, já afundando na areia fofa. Ah! Foi uma dupla alegria — a minha e a dele — a retomada do fôlego ao cair na água. Aqui, a galeria de arte de Peter Pharoah é impressionante e inusitada.
  • Little Karoo — de George, pela N2, chega-se a Oudtshoorn, conhecido centro de criação de avestruzes e emas, desde 1860, por imigrantes judeus. A região é semidesértica e, por isso, essas aves enormes estão muito bem lá.
    P1090530Nas fazendas, há currais divididos com vegetação própria para cada etapa do desenvolvimento das aves. É interessantíssimo o processo de criação dos pintinhos, que ao saírem das dezenas de incubadoras são adotados por Jack e Suzy, um casal de pai-e-mãe-avestruzes. O avestruz Jack e a avestruz Suzy, cuidadores dos filhotes, transmitem aos recém-incubados os hábitos ancestrais da espécie.
    As/os avestruzes são muito agressivas e capazes de matar um leão à unha, a sua possante defesa. Essas aves tem o pescoço, esôfago e traquéia móveis, assim podendo girar sua cabeça 360° para cada lado e engolir pedras e tudo que vir pela frente. Os ovos suportam peso de até 150 Kg.
    P1090532O negócio já passou por altos e baixos mas os resultados positivos são maiores. Os “barões das plumas” construíam palacetes — vimos um deles, de 1910, ainda bem conservado — com os lucros da exportação de plumas coloridas para as madames de todo o mundo. Sempre foi bom negócio investir na vaidade feminina! 🙂
    Da avestruz se aproveita tudo. As bolsas de couro são caríssimas. O restaurante serve a suculenta carne e ovos ali mesmo do quintal.

África do Sul – KwaDukuza

É a terra do lendário rei Shaka Zulu. Essa região, próxima de Durban, é um livro de história da África. Os respeitáveis Zulus trazem consigo rica herança de crenças e costumes. Estão na raiz do povo sulafricano. Nos 1800s a batalha entre os Zulus, os Boers — fazendeiros holandeses — e os ingleses pelos “direitos” da terra foi feroz; a determinação do rei Shaka foi vital para a sobrevivência dos Zulus.

Shaka reinou de 1816 a 1828. Na conquista de novos territórios, há registro de massacres cruéis de tribos vizinhas, dispersando-as em grandes migrações. Por outro lado, parecia ser um visionário progressista e uniu o povo Zulu; levou desenvolvimento e bem-estar aos súditos. A partir da influência funesta de dois inglêses canalhas e desonestos a serviço do governo inglês, o reino despencou morro abaixo, quando Shaka foi assassinado pelas costas por seus dois meios-irmãos e um auxiliar de confiança.

Na cidade de KwaDukuza, parecida com Contagem/MG, há um museu e monumento dedicados a Shaka; conservam, também, a pedra onde se sentara para meditar e na qual foi morto.

O nome antigo de KwaDukuza era Stanger; nota-se o interessante processo da troca de nomes europeus para os de língua nativa, aliás, por toda a África do Sul. É um ótimo sinal da recuperação da cultura, da estima e das raízes dos legítimos donos da terra. Os Zulus estão na África do Sul desde 250 d.C.

Perto dali, Hermannsburg, um pequeno povoado com uma excelente escola de ensino maternal, fundamental e médio. É muito bem organizada, são sobrados arejados, cercados de extensos campos de gramas e jardins à margem de um lago. A escola foi fundada por 8 missionários e 6 fazendeiros alemães em 1857. Funciona até hoje. São luteranos mas não há restrição a qualquer culto.

A limpeza faz gosto! Há piscina, quadras de esporte e internato. Os pais tem condições financeiras para os custos escolares e o ensino é de alto nível. Frequentemente os alunos vão para a Alemanha, sendo diretamente aprovados no “Abitur”, uma espécie de vestibular.

O museu da escola é uma viagem pelo túnel do tempo; revela o trabalho árduo, contínuo e determinado destes pioneiros. Ainda que questionável o despropósito de qualquer catequização os benefícios resultantes da cultura alemã são visíveis.

Os alunos Zulus e Africâners estudam inglês, africâner e alemão. Essa convivência mista, impensável há apenas 20 anos, é um grande avanço; contudo, a convivência de igual para igual ainda demorará muito. Parece que os africâners se sentem, ainda, os reis da cocada preta…

 

Brasil, um grande lixão?

É desanimador o resultado da celebração do reveillon. As pessoas saem às ruas para a festa de passagem do ano, bem vestidas, confraternizam-se, fazem planos e projetos, têm alegres expectativas… e o saldo em 2014? Centenas de toneladas de lixo nas ruas, praias e praças!

O Estadão, em maio/2013, publicou os dados alarmantes: as cidades brasileiras não cuidam do lixo. Por ano, são 168 (!) estádios do porte do Maracanã cheios de lixo despejados em condições impróprias, em lugares inadequados.

Em 1876 o francês Aleixo Gary criou o serviço de limpeza de rua no Rio de Janeiro, que só mais tarde passou para a administração municipal. Os coletores de lixo foram denominados “garis” em homenagem a este visionário, que não ficaria nem um pouco satisfeito ao constatar a situação do lixo no Brasil. Mais de um século depois, a cidade do Rio de Janeiro está em 9º lugar entre as 20 cidades mais sujas do mundo. Mais de um século depois, nós brasileiros não conseguimos fazer o ato mais simples, rudimentar, primário e elementar da civilização: colocar o lixo no lixo.
A consequência deste comportamento leva à irrespondível dúvida: se não conseguimos compreender e executar este ato básico, seremos capazes de exercer a cidadania? Haverá possibilidade de o povo brasileiro se desenvolver dignamente?

O primeiro sinal do grau de cultura e civilidade de um povo é a limpeza dos espaços públicos. Tóquio está em primeiro lugar na lista das cidades mais limpas do mundo. Vimos lá grupo de pessoas recolhendo, se houver, um mínimo de lixo às margens do rio, nas ruas e praças. Isto é uma rotina das famílias japonesas. Vimos, pela manhã, os proprietários de lojas e restaurantes limpando a poeira da porta de seus estabelecimentos. Aqui, “neste país”, quando alguém varre as calçadas, joga o lixo na rua, nos bueiros.

Nas copas do mundo de futebol, as equipes de limpeza entram nos estádios imediatamente após os jogos para recolher o lixo. Em 2006, na Alemanha, os garis tiveram uma grande surpresa: no lado da torcida japonesa não havia, sequer, um papelzinho de bala nas arquibancadas. Este fato nos traz uma ínfima e desesperada esperança:

Se outros povos podem, se outros conseguem, por que não os brasileiros?

África do Sul – Port Elizabeth

Voamos de Durban para Port Elizabeth. Os aeroportos  são muito amplos, arejados, com ótimos serviços a preços normais; parece não ser comum $explorar$ o passageiro nos restaurantes e adjacências.

Port Elizabeth ou “pi-i” (P.E.), como os nativos a apelidaram, é um dos melhores portos da África do Sul. A cidade é muito agradável, limpa, com pitorescos e belos edifícios em estilo vitoriano à beira-mar, as calçadas e ruas bem largas e belíssimos jardins. O nome é uma homenagem do governador inglês, em 1820, à esposa Elizabeth, que morreu muito jovem — em africâner, chama-se “Die Baai”. Já em 1488 o português Bartolomeu Dias passou por aqui; na navegação, a região era conhecida como lugar de água fresca.

P1090350Esta região é de gente muito rica. O espaçoso e confortável hotel era uma antiga residência. Os lençóis tem o nome/endereço 39 on Church bordado à mão em ponto-cheio perfeito. Os quadros de flores e especiarias são da melhor qualidade. De bom gosto, as toalhas verdes com bolas brancas no restaurante; daqui, a vista da piscina com uma explosão de azaléias… a sala de estar com macias poltronas tem um rico acervo de arte e literatura. Ao lado, um aconchegante “pub”, do próprio hotel, para uma boa conversa e bons uísques.

As pessoas recebem os turistas amigavelmente e a convivência entre os brancos e os “black” e “colored” já está superando os conflitos passados, tendo a população não-branca alcançado, em geral, um nível muito melhor do que no Brasil. Uma simpática garçonete black nos falou sobre o filho na universidade. Tem uma situação confortável, não se casou e diz estar muito bem assim… 🙂

Interessante é que as mulheres não alisam os cabelos, não fazem chapinha, apliques ou outras mazelas. Vimos, nas ruas, cabelos trançados em verdadeira arte, anelados, enroscados, ao vento! Todos muito bonitos e cheios de charme. Parece haver uma valorização das peculiaridades das raças e características das etnias.

P.E., além dos safaris, é a capital dos esportes aquáticos, os naufrágios e os corais fazem a festa para os mergulhadores nas águas mornas do Índico. O Nelson Mandela Bay Stadium — copa de 2010 — é uma beleza.

A Art Route 67 é uma atração, principalmente pelos mosaicos e os recortes em metal das figuras de Mandella com crianças. Significativa é uma escultura de uma mulher africana segurando uma cadeira… fica a cargo de cada um a interpretação. Para nós, é um gesto refletindo a grandeza de servir, de cuidar.

Port Elizabeth tem uma localização privilegiada na Algoa Bay, sendo ponto de chegada ou partida da “Rota Jardim” — Garden Route, uma das mais belas rotas turísticas do mundo.

Impressões de Viagem: Islândia

As Erínias também estão fascinadas com as erupções na ilha. É esta mistura de assombro e encantamento, que alimentou o sonho de infância de Alecto, que intrigada percorria os paises mais distantes e exóticos num velho e mágico Atlas…

Aquela pequena ilha perdida no oceano Atlântico, dependurada no círculo Polar Ártico, era a misteriosa terra do gelo, dos vulcões, das cascatas de água fervente brotando das fendas. Naquela época, a Islândia ficava, ainda, mais longe e inacessível para o dedo bem pequeno, que viajava naquelas páginas…

Como todo desejo costuma se realizar, as Erínias, numa clara manhã, temperatura média em julho de 2°C, aportaram em Akureyri para os revigorantes banhos em água sulfurosa, abertos desde o ano de 1300; são divisões das placas continentais que expelem águas sulfurosas a mais de 130°C; antes de chegar às piscinas naturais precisam ser resfriadas; a água azulada com a consistência cremosa de xampu provoca uma deliciosa sensação! Dos poços sulfurosos a vista das rochas vulcânicas multicoloridas naquela imensidão vazia…

As usinas geo-térmicas estão funcionando a todo vapor. 🙂 A água quente na Islândia é praticamente gratuita e distribuida à vontade; a energia elétrica tem duas fontes: termo-életrica(vapor) e hidro-életrica(represa), portanto é muito barata e não poluente. O ar é puro e, quase, não existe poluição. Que ironia agora!

Há um programa do governo, já bem adiantado, para substituir o diesel pelo hidrogênio; já funcionam ônibus movidos a hidrogênio.

A Islândia é a democracia mais antiga da Europa; eleições há mais de MIL anos; a penúltima presidenta ficou 16 anos (muitos políticos por aqui ficariam verdes de inveja),  escolhida em eleições livres sem manobras, manipulação ou outros tipos de pressão conhecidos nestas pl(r)agas sul-americanas; até bem pouco tempo não havia residência “oficial”; os presidentes continuavam a morar na própria residência.

O atual presidente foi reeleito e, possivelmente, irá para o terceiro mandato por única vontade popular! Há, sim, muitos partidos políticos, que se interessam pelo bem estar da população; alguns se limitam a um único município. É comum, na Islândia, um governo de coalização.

A capital Reykjavík é bem arborizada, apesar de as árvores crescerem mais vagarosamente por causa do vapor d’água sulfurosa. Em plena praça, há fontes que exalam vapor. A cidade é moderna mas conserva, com cuidado, a parte antiga do centro e algumas casas ainda são originais (1786). A antiga prisão é hoje o escritório do primeiro-ministro.

Os icebergs fazem parte da paisagem, são majestosos e inigualáveis recortando o horizonte.

África do Sul – Drakensberg

A 250Km de Durban está Drakensberg. É uma Serra da Mantiqueira espetacular — os rapazes da Músicas do Espinhaço iriam enlouquecer de vez! 😉 Não, não se consegue descrever bem o tal do Drakensberg!

É uma cadeia ondulada de montanhas, em 360 graus de verde, com enormes pedras de granito em esculturas impressionantes. O Pico Catedral, majestoso, desafiador a mais de 3000m, é formado por um cinturão de basalto com fios de água em todas as fendas. Um cocoruto verde, macio, forma um chapéu gigante! A “catedral” é um conjunto de dois picos iguais à “Fafá de Belém” em Fernando de Noronha e esconde pinturas rupestres, límpidas e gostosas cachoeiras.

Chega-se à “Doreen Falls” caminhando à margem de um rio cheio de pedras e saltos. É uma queda bem alta dentro de uma cava. Um mergulho é irresistível, mesmo de roupa e tudo. Um banho de cachoeira nos faz sentir integrados à terra, ao lugar. Não se pode chamar de viagem, como experiência cultural, se você é um mero espectador de uma dança típica, à margem de uma cascata ou se não se aproxima para ouvir os nativos e provar da comida. Viajar é, principalmente, procurar aquela criança perdida dentro da gente há muito tempo…

O Cathedral Peak Hotel, encrustado no pé das montanhas no uKhahlamba/Drakensberg Park, disfarcado entre as árvores, é muito especial. Os jardins são belíssimos. As flores todas do Brasil estão aqui em tamanho duplo e triplo. Vimos famílias de macacos brincando por perto. De propriedade de gerações de holandeses, agora africâners, o hotel oferece trekking, cavalos, bicicletas, quadras de tênis, golfe, pescaria, escaladas, paraglider, canoagem e passeios de helicóptero — ufa! A pensão completa com extenso balcão de sobremesas é peccato!

Todo o entorno de Drakensberg é muito verde e os povoados bem arrumadinhos, com as típicas casas redondas cobertas de sapé, tornam a paisagem bem peculiar. Vimos hordas de alunos com diferentes uniformes se dirigindo para, pelo menos, três escolas secundárias e uma “high school” com ótimo aspecto.

Despedir do “Espinhaço” africano foi uma pena… Drakensberg é um lugar onde a sensação de irrealidade, a de sonho e a de mistério se misturam num encantamento palpável!

Anna

…é uma figurinha adorável! Lembra muito a Maude de “Ensina-me a Viver“. Bem-humorada, com leves e coloridas roupas, curtiu intensamente os dias africanos ensolarados e bem quentes; adorava o contraste muito agradável aos graus negativos do inverno europeu.

Anna tem dois filhos. Uma nora é amigável, desfruta da boa companhia da nem-parece-sogra. A outra… bem… não pode suportar o riso fácil, a capacidade da “mãe-do-marido” de viver intensamente o agora, de receber cada momento como um presente dos deuses.

Sem qualquer preparo ou desejo, Anna se tornou diretora das empresas do marido. Foi a solução imediata e drástica para evitar uma falência. O marido morrera, depois de apenas quatro meses, com câncer no fígado. Ele nunca falou disto pra ninguém, como não costumara falar dos negócios ou de si mesmo. Entre todas as dificuldades, Anna enfrentou a ambição da vice-diretora em usurpar-lhe o lugar. Inteligentemente, Anna apresentou à “onça” o desafio:
— Vá ao banco, pague a dívida da empresa de 300 mil marcos — a moeda da época — e o cargo é seu!!
Claro, a interesseira nem voltou à fábrica para desocupar as gavetas.

A inexperiente, mas resoluta, diretora contratou novos empregados, pôs em prática idéias mirabolantes de tão simples 🙂 e saiu-se muito bem pelos 21 anos seguintes. O resultado é que viaja sozinha — um luxo! — por todos os cantos, com a $retirada$ da empresa. Recentemente esteve em Sri Lanka e na Índia.

Com boas risadas, conta as peripécias para vencer e curar um câncer de pele no nariz. Diz ser isto mais um motivo para aproveitar todos os dias. Simplificando a vida, Anna trocou a casa grande por um pequeno e confortável apartamento. Curte os netos, encontrando-se com eles nos aniversário, indo juntos ao cinema, teatro e concertos no parque. Ela faz parte do clube das “duas alegrias“…

Anna conseguiu uma convivência equilibrada com os netos e filhos que a procuram, porque fugiu do paradigma das mães-avós sempre disponíveis aos gostos, caprichos e vontades dos pimpolhos e adultescentes. Eles a tratam com uma séria dignidade.

Anna deixou-nos belas lembranças; o bom convívio nestas poucas semanas por este mundão africano valeu por muitos anos. Ah! Nossa amiga tem apenas 82 anos…

África do Sul – KwaZulu-Natal e Durban

Hluhluwe River Lodge — o primeiro nome, em Zulu, impronunciável — é um hotel muito confortável numa reserva florestal. As mesas no restaurante estão sob as estrelas com vista para o Lago Sta. Lúcia, habitat de hipopótamos e crocodilos. Os chalés com varandas, espalhados pela mata, são muito espaçosos, com camas enormes cobertas com cortinados e agradável silêncio.

A comida é da melhor qualidade. Aliás, a grande variedade, o sabor delicioso da comida são pontos altos em todos os lugares da África do Sul.

A província de KwaZulu-Natal, que une o reino Zulu à antiga província de Natal, está na costa oeste da África do Sul. Limita-se com Cabo Leste ao sul e Moçambique ao norte. O belíssimo litoral, banhado pelo cálido Oceano Índico, é recortado por montanhas, cachoeiras, lagos. Plantações de milho, bananas, abacates, cactos, laranjas, lúpulo, amêndoas e cana de açúcar perdem-se de vista num mar verde ondulante.

A travessia do Lago Sta. Lúcia, em iSimangaliso, nos oferece uma excepcional biodiversidade. Às margens, um enorme bando de pássaros amarelos trabalha febrilmente na engenhosa construção dos ninhos: dois caniços são unidos com uma espécie de palha, da própria planta, trançada em forma redonda com a “porta” virada para baixo, protegida das intempéries. Quanto mais se contemplava os belos pássaros, mais incrível e mágica se tornava aquela inimitável arte. Estes ninhos são para a temporada de verão!

Retomamos a rodovia para Durban. São 330 km banhados pelo Índico azul e brincalhão. As cidadinhas são bem arrumadas e limpas. As frutas tropicais são de um colorido bem forte e dulcíssimas.

O nome “Rio de Natal” foi dado à cidade pelos portugueses; em 1835 passou a ser Durban — Benjamin d’Urban era o governador na época. É uma cidade cosmopolita; o centro histórico conserva a rica herança cultural de diferentes povos e etnias. O estilão dos prédios lembra o de Dublin. A presença indiana é grande; Mahatma Gandhi viveu em Durban por 21 anos e foi lá que formou sua filosofia de resistência pacífica pelos direitos humanos. A África do Sul é aberta a todas as religiões e cultos, que parecem conviver bem. Templos hindus, mesquitas, igrejas e sinagogas enfeitam Durban.

Pululam campos de golfe a cada curva e em junho/julho acontece a famosa migração de bilhões de sardinhas caçadas por tubarões, golfinhos e pássaros. Os esportes aquáticos, maratonas e corridas de bicicleta são constantes, com participação bem grande de toda a gente. As praias de Durban são tão bonitas quanto as nossas.

A nota infeliz de Durban são os bairros pobres ao sul, onde as casas se espremem entre fábricas e refinarias poluentes, sem qualquer filtro ou outra medida protetiva. Aqui, também, a ânsia do lucro e a omissão governamental sacrificam o povo.

No bairro do nosso hotel, muitos bares bem ao estilo dos “butecos” de Belo Horizonte, cheios de gente bonita e alegre, onde vimos raros brancos. A diferença é que o movimento começa e termina bem mais cedo. As árvores são enormes, antigas e imponentes e os jardins bem cuidados.

O Moses Mabhida Stadium, construído para a Copa de 2010, é moderno, funciona para muitas outras atividades e um bondinho leva turistas para o alto, de onde se tem uma vista panorâmica da cidade e do Oceano Índico. Uma maneira inteligente de gerar renda, pois é um passeio muito procurado por nativos e turistas.