Pelos padrões da Groenlândia é cidade grande com 4 mil habitantes. É um mundo de fiordes cheios de icebergs gigantes formados pela movimentação das geleiras; neste a magnífica visita de baleias jubarte.
Estes icebergs têm, pelo menos, 800m abaixo da superfície e 100m ou mais de altura. Em um barco pequeno navegamos entre os gigantes que nos levam a um perplexo silêncio.
De Alexandria — Egito — contornamos o delta do Nilo até Port Said, onde começa o Canal de Suez, hoje com 195 km. É a rota mais curta entre o ocidente e o oriente. Esta via marítima situa-se na região montanhosa e desértica da Península Sinai, entre Egito e Israel. Aí, o pico de granito do Monte Sinai sagrado para o Cristianismo, Islamismo e Judaísmo.
A construção do Canal de Suez, durante dez anos, é uma odisséia magnífica e trágica. Vinte mil trabalhadores escravos eram substituídos a cada dez meses, tal a dificuldade em escavar à mão as pedras e remover as areias do deserto. Sequer havia carrinhos de mão; só mais tarde foram importadas pás e picaretas da França. Um milhão e meio de egípcios participaram da construção. Houve cerca de cento e vinte mil mortos.
Ainda havia os empecilhos provocados pelos caprichos do deserto: muitas vezes as tempestades de areia cobriam e fechavam as vias já escavadas, como também na tentativa dos faraós de unir o Rio Nilo ao Mar Vermelho, projeto abandonado após mil anos de reveses.
O jovem diplomata e engenheiro francês Ferdinand de Lesseps foi o grande visionário e propulsor desta obra.
O objetivo de Lesseps foi uma via de comércio e comunicação para todos os povos. Sem a ousadia deste determinado empreendedor os faraós modernos não veriam navios…
Do deck do MS Amadea se descortina este oásis além de um muro de pedras.
O nome Maraú vem da antiga aldeia indígena Mayrahú descoberta por frades capuchinhos em 1705; está a 140km do aeroporto de Ilhéus. Chega-se à Pousada do Cassange pela rodovia BR101, com uma parte de terra. A viagem é agradável, com muito verde e vista para o mar.
Por esta trilha no meio do mato, bem pertinho da pousada, chega-se à lagoa.
Aqui, nesta reserva da Mata Atlântica, é ótimo para esportes à vela, stand-up, caiaque e repouso na água.
Esta singular arquibancada nos reserva um luminoso entardecer.
As ondas valentes e mornas são massagens revigorantes e saram tudo! Todo o tempo é curto. Daí ser inexplicável o turismo-vitrine, quer dizer, “observar apenas”… a uma distância regulamentar. A propósito, e para reflexão, um comentário no livro de hóspedes:
Mar maravilhoso. Desta vez, entrei pouco, não faz diferença, porque voltarei ano que vem.
Não é mesmo um grande desperdício deixar para o “ano que vem” tudo isso?
Fizemos a viagem pela Andarilho da Luz, inclusive o transporte de ida e volta para Ilhéus. Nas imediações há dezenas de outras praias e cidadinhas antigas, além da Cachoeira de Tremembé.
Nosso motorista e guia — Zé Domingos, (73)99824-8297, muito eficiente e bem-humorado — nos levou, também, às piscinas naturais de Taipu de Fora e nos apresentou a elegante graviola:
Aqui o viajante apreciador dos mistérios dos rios e das florestas vai descobrir um lugar maravilhoso! Já o turista apressurado poderá submergir em ondas de tédio.
Em um vôo de 50 minutos chega-se a Tefé. A cidade bem antiga com, aproximadamente, 70 mil habitantes, era a região dos índios Tapibas e centenas morreram na luta contra os espanhóis.
Na região cultiva-se a mandioca brava para a produção de farinha e, também, a macaxeira para o consumo culinário. A venda e compra de peixes é importante fator econômico. Incontáveis barcos de todos tipos, apinhados de gente, cortam de cima a baixo o lago formado pelo rio Tefé, afluente do Solimões.
No porto o esgoto corre a céu aberto para o rio, parecendo bem precário o recolhimento de lixo. Aliás, o hábito de brasileiros jogarem tudo na rua é incompreensível e, infelizmente, impõe-se uma conclusão: se nós somos incapazes de um ato civilizado tão simples, jamais alcançaremos a cidadania.
Neste porto embarcamos no barco da Pousada Uacari para uma imersão na floresta. São deliciosos 90 minutos flutuando entre árvores, flores, frutos e pássaros.
Na várzea entre os rios Solimões e Japurá entra-se pelo Canal do Lago Mamirauá. Aí, presa às margens por cordas a pousada flutuante Uacari, nosso destino.
Logo depois da confluência dos rios Japurá e Solimões entra-se no Canal Mamirauá… aqui a primeira imagem — ou será uma miragem? — das telhas cor de tijolo feitas de garrafas-PET ao estilo das ilhas do Pacífico sul: a Pousada.
O visionário e brilhante biólogo Márcio Ayres anteviu, num projeto pioneiro de 1997/99, uma reserva ambiental protegida cuidada pelos ribeirinhos, os legítimos senhores da floresta.
Este incrível primatologista tornou possível a utopia de promover o manejo sustentável dos recursos naturais com a efetiva participação das seis comunidades integrantes da reserva.
A região é muito quente; a umidade triplica a sensação térmica. Assim, os passeios são, inteligentemente, programados para bem cedo e à tardinha. Ao meio-dia, o zênite solar leva todos — até os jacarés vizinhos — a uma reparadora soneca depois do delicioso almoço. A temperatura e a umidade nos fizeram antecipar a volta!
O exótico macaco Uacari — o querido de Marcio Ayres — corria sério risco de desaparecer, assim como peixes-boi, pirarucus, tracajás e, em consequência, outras espécies endêmicas. Hoje essas espécies se multiplicaram e a degradação regrediu drasticamente. Ainda há muito trabalho, mas o resultado de Mamirauá, através do desenvolvimento e capacitação das comunidades deveria ser buscado por todo este Brasil.
O regime de enchentes e vazantes estabelece modus vivendi específico e diferente para bichos, peixes, aves, plantas e ribeirinhos da Reserva de Mamirauá. Nas cheias, de dezembro a maio, 1 milhão de hectares ficam submersos. Na seca, de junho a novembro, a admirável cigana ou hoatzin…
Exímios mergulhadores preferem peixes pequenos, não representando assim concorrência para os ribeirinhos que os protegem. Aí o merecido descanso depois do expediente.
Embaixo destas árvores, nas cheias, alguns peixes fazem cavernas nas margens e ali depositam ovos; pode-se ver este “estacionamento” de buracos. Também nas cheias, em uma adaptação formidável, outros peixes se alimentam dos frutos altos das árvores e desovam entre suas raízes. As enchentes podem alcançar até 15m ou mais. O único meio de transporte é o barco.
Mesmo com todos os cuidados da Reserva de Mamirauá há, na Amazônia, segundo estudos recentes, 48 espécies de aves ameaçadas de extinção, principalmente pela implantação de hidroelétricas e do desmatamento. Estes passarinhos enfrentam, sim, a ameaça cruel: a indiferença do homem…
Aqui, a marca indelével é a diversidade deste mundo de águas. Visitamos Caburini descendo pelo rio Japurá. As margens oferecem o toque pitoresco das moradias…
Impressiona a boa adaptação dos bichos e dos homens. Nas cheias, as onças, por exemplo, se empoleiram nos galhos mais altos das árvores. A comunidade Caburini transporta as casas conforme o deslocamento do rio nas cheias. É uma praia de areias ricas em nutrientes transportadas pela correnteza. Perfeito o banho nas águas mornas do rio!
É frequente, também, elevar o nível das “pernas” das palafitas, pois a água chega a ultrapassar os 5 metros. Implantaram a boa idéia de uma cozinha comunitária; cada qual leva um ingrediente.
Os ovos de tartaruga são cuidados e protegidos sob orientação do patriarca, seu Sandro. Para multiplicar a sobrevivência, enterram-nos mais perto de suas palafitas e ajudam os filhotes a alcançar o rio. Afastam os pássaros fregueses do manjar de ovos!
Aqui vive a maioria dos funcionários da Pousada Uacari. A criatividade dessa gente amável atinge o máximo nessa academia; aí o seu Sandro “puxando ferro”:
Os frutos de Mamirauá se devem à iniciativa de mentes brilhantes e dos saberes dos ribeirinhos longe dos centros do poder e de gente cheia de teoria. O grande mérito de Marcos Ayres foi acolher o jeito de cuidar dos bichos e plantas transmitido pelos bisavós, acrescentando-lhes a técnica adequada e pesquisa científica. A participação dos ribeirinhos tornou-se fundamental para fixá-los à terra de origem, incentivo à propriedade privada e à limpeza das áreas sem uso do fogo.
Ao voltar, é forte a sensação de ter vivido nem um milésimo de toda a fartura deste universo.
As Ilhas Mascarenhas — descobertas pelo português Pedro Mascarenhas em 1505 — compreendem Mauritius, Réunion e Rodrigues perdidas em um Éden tropical, sudeste de África. As extensas areias brancas e vegetação exuberante.
A ilha vulcânica é próspera, uma rica cultura preservada, há séculos, por indianos, creoles, chineses, franceses, holandeses, portugueses e africanos. É a maior renda per capita da África. Port Louis é a capital colonial:
A população multiracial favorece o exercício cotidiano da cidadania e da tolerância. São perceptíveis a tranquilidade e o viver democrático pela variedade de sotaques ouvidos nas ruas da capital: créole, hindi, tamil, marathi, além do francês, inglês… …envolvidos pelas músicas e danças contagiantes. Há ainda o fator principal para esta convivência: em Mauritius não há religião oficial e, portanto, nenhuma restrição a qualquer culto.
Port Louis é o ponto de partida para os melhores mergulhos do mundo e para qualquer outro desejo de trekking, balões, cavalos e esportes aquáticos. O litoral brasileiro tem praias belíssimas, sem dúvida. Contudo a diferença indiscutível é a limpeza e a segurança nestas ilhas.
A França dominou Mauritius entre 1710-1810. A princípio, como aconteceu em outras regiões, os indianos foram enganados por falsos contratos e viveram, por muito tempo, em regime de severa escravidão. Desde 1968 não se tem notícias de disputas políticas ou militares, levantes e ditadores. Vigora o sistema democrático parlamentar com eleições regulares a cada 5 anos para os chefes de estado e de governo.
O nome Mauritius foi homenagem ao princípe Maurits van Nassau, aquele mesmo holandês apelidado de “o brasileiro”, cuja excelente administração (1637-1644) iria transformar Recife em uma cidade moderna. Cabe aqui uma indagação: como teria sido o Brasil holandês? Apesar de toda a crueza envolvida em uma colonização, as ocupações holandesas tiveram um nível de desenvolvimento razoavelmente mais alto.
A ilha ocupa o terceiro lugar em produção mundial de açúcar. Cultiva-se também tabaco, flores e chá. Por falar nisto, experimente nestas tardes quentes o chá das ilhas: um punhado de capim-cidreira, torcer bem ou picar ou bater no liquidificador; colocar água quente, abafar e… geladeira por 2 dias antes de coar. Uma delícia!
Aqui se fabricam navios em miniatura; depois de 200 horas de trabalho manual, o resultado é a mais requintada das artes. O Jardim Botânico é um dos mais bonitos do mundo. Vimos, também, o selo “Mauritius Two-Penny”, avaliado em torno de US$2 milhões.
A nota dissonante na Ilha Rodrigues é a pesca incessante e prolongada de octopus. Nesta atividade, as mulheres vêm quebrando os corais. Os polvos dependem dos corais e, assim, ambos estão em risco de extinção. Este trabalho típico de mulheres beira a crueldade; é pouquíssimo dinheiro e drásticas as consequências ambientais.
Mark Twain, o pai da literatura americana, em definição primorosa:
Criou-se Mauritius primeiro, depois o paraíso foi a cópia.
O Vasa — nome da dinastia — afundou numa clara manhã de 10 de agosto de 1628, em poucos minutos, a 1300m do porto do arquipélago de Stockholm, diante do rei, de toda nobreza e de convidados ilustres. Dos 445 tripulantes e soldados pereceram entre 30 e 50 pessoas.
Na maiden voyage — viagem inaugural — a nave mais potente da marinha sueca, a menina dos olhos de Gustavo Adolfo II, inclinou-se sob uma rajada de vento; a água infiltrou nas canhoeiras abertas e a obra-prima desapareceu nas profundezas do Báltico. Aí permaneceu por mais de três séculos.
O Vasa foi projetado corretamente; contudo o rei fez exigências extravagantes para o seu palácio flutuante. Por exemplo, transportar 64 canhões, o dobro do peso previsto. A idéia do resgate, por volta de 1950, veio de Anders Franzén, arqueólogo e técnico naval. Com a obstinação dos visionários, Franzén localizou o navio e a ressurreição do Vasa levou 30 anos! Somente a retirada do mar exigiu quatro de trabalho árduo. Os mergulhadores furaram túneis sob o casco, lançaram cabos de aço e içaram o navio com o madeirame praticamente intacto.
O motivo do bom estado da madeira é também uma grande sorte: o molusco Teredo Navalis é um devorador de madeiras de navio. Não teria sobrado uma lasca do Vasa se o Mar Báltico não estivesse poluído e se fosse mais salgado. O gosto das águas salobras não são do paladar do Teredo.
O Vasa Museet foi construído especialmente. São 7 andares de onde se vê tudo de todos os ângulos. Há réplicas de compartimentos onde a gente pode entrar, bisbilhotar, como se estivesse navegando…
A equipe altamente especializada conseguiu montar o gigantesco quebra-cabeças das milhares e milhares de peças soltas, 700 esculturas de leões, deuses, heróis gregos e romanos, animais marinhos, símbolos da cultura sueca e ambições políticas; eles refizeram, também, esqueletos humanos e pertences.
Vasa, Suécia – Domínio Público
Para a preservação das velas, da madeira, das cores reavivadas cuidadosa e fielmente, a temperatura tem de ser muito baixa e a luz comedida. Tudo aqui exige manutenção contínua. Um ritual cotidiano reconhecido pelos 1 milhão de visitantes / ano.
O resgate e a reconstrução representam uma esplêndida odisséia. Aqui a atmosfera do passado, futuro, devaneio, aventura nos faz ficar suspensos…
Navegamos, desta vez, as águas dos conquistadores romanos da Gália, atual território francês. O rio Rhône — a gente aprendeu na escola rio Ródano — nasce nos Alpes suíços, alimenta o Lac Léman, deságua no Mediterrâneo. Ao longo de 812km é um refúgio de vida selvagem. A cada momento, bandos de aves pescam e os flamingos são os moradores mais ilustres. O majestoso rio Saône se junta ao Rhône em Lyon. Formam uma parceria belíssima:
Lyon — a mais antiga da França, habitada desde 600 a.C. — é o principal ponto nas rotas para Paris, Alpes, Espanha, Itália e norte da França. No aeroporto, a elegante estação/Gare Lyon Saint-Exupéry:
Aliás, Lyon acorda a partir de 11:00 quando os cafés, restaurantes, as lojas oferecem “guloseimas” de todos os tipos e níveis. Como qualquer centro comercial rico e ativo, tudo gira em torno de comprar e vender. É impressionante a força desta engrenagem girando ad infinitum. O pessoal compra e compra… objetos desnecessários, inúteis pelos quais gastam-se tempo e energia. Jogamo-los fora e voltamos para a roda.
Os traboules — passagens e escadarias originalmente usadas por contrabandistas medievais— foram pontos de resistência na Segunda Guerra Mundial; hoje são charadas arquitetônicas. As dezenas de pontes são obras de arte; esta lembra van Gogh, não?
Les Halles, o tradicional mercado francês — em Belém do Pará, Brasil, há uma valiosa réplica do de Paris — modernoso, todo de vidro, é um mundo de comida étnica, carnes, frutos do mar, molhos exóticos, queijos, vinhos e cheiro muito bom. Sem dúvida, Lyon é a capital gastronômica da França. Uma doçaria armênia:
Interessante notar a economia de espaços; por aqui, tudo agarradinho, as mesas e cadeiras bem próximas, qualquer corredor ou cantinho é bem aproveitado.
A cidade toda enfeitada com as árvores floridas. Ao longo dos rios Saône e Rhône outras formam intrigantes esculturas:
Embarcamos no confortável navio da Phoenix, MS Swiss Gloria. A partir daqui são cidadinhas muito especiais espalhadas pelos vinhedos a perder de vista. Chalon-sur-Saône, por exemplo, produz os melhores e mais caros vinhos do mundo. As terras ali alcançam a cifra de bilhões de Euros.
Curtimos muito os caminhos por onde este barco nos leva. É uma viagem não muito comum. A paisagem vem ao nosso encontro no deck. Pode não ser o turismo para uma grande maioria. Certamente agradará aos viajantes observadores dos contrastes, do valor do passado, das transformações através dos tempos. As ruínas, as arenas seculares, as tumbas, as peripécias de van Gogh transmitem enlevo, lição, espanto, ironia e… bom humor…