Border Collies — Cães Pastores na Irlanda

Ainda no Ring of Kerry, um espetáculo formidável e incomum, pelo menos por estas bandas. O pastor de ovelhas Brendan Ferris faz uma excelente demonstração do trabalho dos cães nas fazendas irlandesas. O pequeno rebanho é movido em qualquer direção através de apenas assobios e gestos. Brendan tem marcado senso de humor, talento e muito carinho com os cães. São realizadas competições regulares e estes cães tem alto valor no mercado. Na Escócia, há os “bearded collies”.

Os “border collies” são treinados progressivamente a partir dos nove meses por um período intermitente de 12 a 18 meses. Exercitam-se árdua, alegre e diariamente por 8 a 9 anos, quando se aposentam. É significativo constatar que, em geral, eles são os mais longevos e saudáveis da raça canina. Este exemplo dá para pensar…

Inicialmente, à medida que Brendan vai pronunciando os nomes das ovelhas, cada uma se afasta do grupo para se apresentar ao público. São de tipos e temperamentos variados.

Com outro grupo, os cães demonstram suas habilidades, atenção e destreza ao conduzir as ovelhas dispersas pela montanha. Sob o sutil e, quase sempre, bem-humorado comando de Brendan, os cães levam as ovelhas para a direita, esquerda; rosnam, as fazem correr, as colocam em círculo ou as separam, enfim, são competentes guias.

É mínima a possibilidade de insurgência das ovelhas, cuja obediência imediata é o sonho de muitos governos e religiões! Alguns conseguem…

Observar este ofício tradicional, útil e interessante na magnífica paisagem do Ring of Kerry foi um momento delicioso de relax e diversão…

Irlanda de Trem #2

Próximo a Killarney — uma cidadinha muito agradável, com hotéis excelentes — está o Ring of Kerry, a sudoeste da Irlanda. É mesmo um anel de baías azuis numa extensão verde silenciosa cheia de parques e montanhas de até 1041m, consideradas bem altas por lá. A estrada contorna as belíssimas e intocadas baías de Kenmare e Dingle; nesta, foi filmada uma das cenas do clássico “A Filha de Ryan”.
Nas ilhas próximas monges agostinianos moraram em mosteiros desde o Séc. VI e foram um enclave de cultura e desenvolvimento até o séc. XII naquela região.

Limerick é a cidade do rugby irlandês e do ator Peter O’Toole. Nas proximidades, o Bunratty Castle data de 1425; é mais uma das típicas construções residenciais dos nobres da época. Na costa oeste, os “Cliffs of Moher”, considerados uma das maravilhas do mundo. São penhascos indomáveis de 200m de altura e 8km de comprimento, cortados pelo mar e ventos gelados. É um desses lugares onde as fotos ficam pálidas e as palavras muito pobres… fica-nos uma profunda impressão de mistério e força.
Neste lugar, é impressionante o cuidado dos irlandeses com o meio ambiente; não há construções à vista, é tudo subterrâneo. Assim, os penhascos continuam intactos e magníficos sem nenhuma interferência externa.

Chegando a Galway, na baía do mesmo nome, há o Parque Nacional do Burren: é uma enigmática paisagem lunar de calcáreo — similar à da Chapada dos Veadeiros, em Goiás. Em 1649 o Burren já foi descrito, de forma pitoresca, como um lugar onde “não há árvore para enforcar um homem, nem água profunda para afogar, nem terra suficiente para enterrar”.

Irlanda de Trem

Passageiros, todos a bordo… o tempo está perfeito, céu de brigadeiro!
De Dublin (Heuston Station) o trem parte para Cork, uma grande cidade (nos termos irlandeses), pois tem 150 mil habitantes. É a terceira depois de Dublin e Belfast. Aqui tem uma “concorrente” da Guinness e também uma conhecida destilaria de uísque. É uma alegre cidade universitária e hospeda filiais de multinacionais importantes, como Apple, Google e Yahoo. O mercado é limpíssimo, cheiroso com todos os tipos de queijos e peixes que se pode imaginar.

O destino é Cóbh, porto importante de emigração, último embarque no Titanic, tema muito bem exposto. Há uma mostra impressionante das péssimas condições dos emigrantes. Importantes as informações sobre “The Great Famine” e a consequente emigração de 3 milhões de irlandeses por este porto.

O highlight deste dia é a visita ao Castelo Blarney e jardins. O castelo foi construído em 1446 e a atração é a famosa Pedra de Blarney: você terá que alcançar o topo para beijá-la e ganhar o presente da “eterna eloquência”. Na realidade, é uma destas estórias que turista adora! Realmente, depois de dúzias de estreitos degraus em espiral, chega-se ao rampart onde o “beijo” exige uma ginástica de Cirque du Soleil… 🙂 deve-se deitar de costas, descer a cabeça até alcançar a pedra suspensa sobre o abismo. Claro, declinamos a honra! Esse tipo de “atração” não nos pega há muito tempo… valem o engenho da construção, o exercício, a vista do verde irlandês e os jardins.

Curioso o “jardim de venenos”. São plantas bonitas, mas não se engane: tem partes ou sementes venenosas. Interessante é que nossos “buchinho”, mamona, hortênsia e ruibarbo, entre outras, estão lá! O jardim das mais variadas samambaias é lindíssimo; a cascata, o frescor, a sombra levam-nos à meditação.

Evelyn Glennie no Minas Tênis Clube

Uma virtuose escocesa, simpática, alegre e muito simples, como o são os grandes, apresentou-se em Belo Horizonte, MG.

Além da forte tradição musical no nordeste da Escócia, onde o desenvolvimento dos jovens músicos é levado muito a sério, o pai tocava acordeon e Evelyn Glennie tocava, inicialmente, gaita e clarineta. Começou a perder a audição aos 8 anos e aos 12 ficou profundamente surda.

Esta artista rompe paradigmas e preconceitos. Por volta dos 15 anos, Evelyn disse à conselheira vocacional que pretendia seguir a carreira musical. A orientadora, perplexa e um tanto obtusa, como sói acontecer, sugeriu-lhe cursar contabilidade (!!). Desde então, a busca do som tornou-se um desafio ainda mais forte. Ela aprendeu a “ouvir” com outras partes do corpo as vibrações sonoras que substituem, incrivelmente, os ouvidos. Sente vibrações específicas, por exemplo, no dedo indicador.

No palco, uma parafernália selecionada dos mais de 1800 instrumentos da sua coleção. A maior percussionista de todos os tempos é criativa e inventa sons de pedras, conchas e constrói instrumentos dos quais extrai belíssimos sons, como o “aquaphone”. A marimba é suspensa para melhor transmissão das vibrações, assim como a apresentação descalça. Ela toca, ainda, o “Hang”: instrumento suiço, incomum, feito apenas sob encomenda.

Evelyn Glennie fala normalmente, com enunciação precisa; não tem sequela alguma da deficiência. Faz palestras sobre a surdez, cuja natureza é incompreendida pelo público em geral. A carreira inigualável desta moça mudou os padrões do ensino musical no Reino Unido. Ela própria é a prova viva de superação, de desafio de limites e de força interior.

De quebra, ela desenha e fabrica jóias de uma beleza ímpar.

O insight incrível de Evelyn é a busca do som em si mesmo, muito além da música: o corpo é fonte de som.

 

Belmonte e Aldeias Históricas em Portugal

O interior de Portugal reserva agradáveis surpresas. São vilas e aldeias com muitas histórias e tradição. Conservam o estilo e as raízes seculares. Belmonte, terra de Pedro Álvares Cabral, a 290km de Lisboa, com as casas de pedra com flores e frutas, as ruelas cheias de curvas, os museus incrivelmente modernos, é muito agradável! Curtimos imensamente a quietude e o silêncio dali; principalmente bem cedo pela manhã e ao começar da noite não há vivalma. Por isto, Belmonte é singular.

A Pousada Convento de Belmonte, na parte mais alta, tem a vista ampla para a Serra da Estrela. Foi um antigo convento dos Franciscanos, a planta original foi mantida, bem como a capela e a sacristia. Os amplos apartamentos são designados pelos nomes dos Frades! A decoração, de muito bom gosto, mantém o estilo antigo aliado ao conforto. Interessantes as ruínas preservadas em dos pátios da pousada. Lá, sim, se pode ouvir as estrelas…

Pousada Convento de Belmonte - Copyright©2013 Rainer Brockerhoff

Sortelha! Ah! Sortelha é uma miragem… o Castelo de Sortelha foi edificado em 1228, para defesa estratégica. Para fixar a população, foi criado ali um couto de homiziados — neste lugar, qualquer indivíduo tinha o direito de fixar-se livremente, ainda que fosse perseguido pela justiça de outra região. No conjunto de fortificações, no interior da muralha, pode se ver, por exemplo, a torre de menagem, cisterna, porta falsa, varanda de Pilatus, a torre sineira e uma pedra de forma peculiar, a Cabeça da Velha. Vale a visita. A região em torno de Sortelha é de pedra-pura e belíssima.

Castelo Novo é uma aldeia em caracol, rodeada por pedras “acolchoadas”. Lá no alto, a arquitetura gótica e manuelina do castelo.

Vir a esta região foi uma inversão de papéis: nós, agora, descobrimos Portugal.

Ilha Norfolk — Austrália

Estas valentes porções de terra cercadas, muitas vezes, por ondas bravias, que  desenham, cortam e cavam-lhe as costas, guardam tesouros e mistérios. Norfolk é uma destas ilhas fascinantes. O vulcão que lhe deu origem espalhou, com gosto por todo o lado, pedras negras dos mais variados tamanhos e formas; o contraste com gramados verdes, muito verdes, se estendendo até as praias de águas cristalinas faz-nos duvidar dos próprios olhos.

As ruínas majestosas e muito bem conservadas das duas penitenciárias, cuja muralha continua intacta, revestem esta parte da ilha de uma aura enigmática; há um silêncio, uma quietude, onde se escutam o vento e as histórias inscritas nas paredes, nas celas, nos corredores estreitos, nas lápides do cemitério. Nos anais do museu o drama do prisioneiro fugitivo das grades, recapturado depois de viver durante 7 anos no oco de uma árvore.

Hoje, em compensação, não há cadeia nem qualquer outro tipo de vigilância. Ninguém tranca a casa nem o carro. No vilarejo com 2000 habitantes, onde a lista telefônica é por apelido, o centro de compras é uma única rua com lojas finas, galerias de arte e modernos restaurantes. Não há semáforo e a carona é o único “transporte público”. Todos se cumprimentam, incluindo os turistas, com o “Norfolk wave”, o polegar positivo! A ilha exporta sementes de palmeiras, fabrica cerveja e chocolate e não usa agrotóxicos.

Norfolk se localiza a leste da Austrália, a menos de duas horas de vôo de Auckland (Nova Zelândia), no Oceano Pacífico; ao sul, o mal-humorado Mar da Tasmânia. Os polinésios viviam aqui antes da chegada do Capitão Cook em 1774. Em meados do século XIX os descendentes do famoso motim “Bounty”, moradores da ilha Pitcairn, já pequena para tanta gente, foram levados para Norfolk… mais histórias para o folclore e cultura…

A rica miscigenação resultou numa linguagem rara: mistura de taitiano e o antigo inglês de Pitcairn. A língua Norfolk está sendo ensinada nas escolas.

Norfolk é inigualável para mergulho em cavernas, abismos e túneis de coral, com infinita variedade de peixes e visibilidade de 20m ou mais. As árvores resistem bravamente aos ventos fortes e daí a estranha e belíssima forma das suas copas. Esta pequena ilha parece manter-se fiel às suas raízes, intocada pelos modismos, plantada nas rochas vulcânicas e protegida pelo oceano-guarda-costa.

Em Norfolk está o barco “Desventura”.

Desventura

Encostado num canto
o barco foi entretanto
belo, forte, altaneiro!
Sumiu a boa sorte
hoje virou canteiro.
É o retrato, talvez
de quem perdeu a vez.
Desistiu. Nem partiu…

Copyright ©2013 Maria Brockerhoff

Raimundo Correia

MAL SECRETO

Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’alma, e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse, o espírito que chora,
Ver através da máscara da face,
Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez existe,
Cuja ventura única consiste
Em parecer aos outros venturosa!

O poeta é exímio conhecedor das emoções, buscando bem no fundo a verdadeira essência humana. “Mal Secreto” vale um mundo de psicanálise! Raimundo Correia, de família de classe média alta, nasceu a bordo do navio “São Luis” em águas maranhenses e por isso dizia: “sou um homem sem pátria, nasci no oceano”. Daí, com certeza, a universalidade da sua poesia.

A Cidade dos Mórmons

…Salt Lake City é muito agradável, plana, arborizada, cercada de montanhas aveludadas.

A natureza é pródiga em Utah! A viagem vale por si só! As estradas rodeadas de vegetação colorida, de pedreiras ponteagudas, nos conduzem à progressiva cidade, sede das Olímpiadas de Inverno de 2002.

Como sempre, deixamos a pouca bagagem no hotel e saímos imediatamente, perambulando sem destino — o melhor jeito de descobrir maravilhas — pelas avenidas largas e limpas, pela praça do capitólio, um edifício imponente cheio de histórias e símbolos. Há muitos restaurantes exóticos, entre eles o Himalayan Kitchen, onde aproveitamos os sabores do Nepal e da Índia: “tikka masala” servido em recipientes e talheres de bronze.

Ainda perambulando, fomos parar no Temple Square: não sabíamos nada sobre este lugar, com 40 mil m² de jardins, templos, escritórios comerciais, conference center, o tabernáculo com um órgão gigantesco e coral de 360 vozes. Ainda, um belíssimo e antigo hotel transformado em memorial do fundador Joseph Smith. A réplica da imagem de Jesus Cristo de Copenhagen (3,4 m), esculpida por um artista dinamarquês, emociona fiéis e turistas. O templo principal, com espelho d’água, fontes e belíssimo jardim é magnífico. A construção toda em granito  foi iniciada em 1853 e durou 40 anos.

Naquele fim de semana se realizava a conferência semestral, com um número incontável de mórmons de todos os lugares. No intervalo de almoço, as famílias faziam piquenique na grama ao som do coral. Tudo bem organizado, muito limpo, muito bonito. Havia muitos jovens com placas anunciando a língua nativa para informações de, praticamente, todos os países. A partir de 18 anos, moças e rapazes já são missionários e partem mundo afora. Ficamos muito bem impressionados com a acolhida carinhosa; éramos “forasteiros” mas, por onde passamos, e de todas as pessoas com as quais cruzamos, recebemos mensagens amigáveis.

Nesta mesma noite tivemos um encontro agradibilíssimo em casa de amigos que confirmaram as gentilezas e a convivência fraternal dos princípios mórmons.