Cabo Hornos — Cape Horn

De Ushuaia navegamos, por vinte e quatro horas, numa imensidão de águas revoltas do Cabo Hornos e Paso Drake. As portas do silencioso Continente Antártico são o prêmio compensador.

Cabo Hornos, Chile – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Contornamos o Cabo Hornos/Cape Horn na ilha do mesmo nome. O único lugarejo é Puerto Williams com 1600 habitantes. Em formato de meia-lua a ilha é coberta, em sua maior parte, por líquens, musgos; daí o nome bosques em miniatura e a observação deste rico microcosmos ser com lupa. O Parque Nacional Hornos é um lugar privilegiado na Reserva Mundial de la Biosfera.

Copyright©2011 University of North Texas Press

Aqui é abundante o arbusto Canelo ou Casca de Anta, cujas sementes atraem as aves austrais. Estas sementes devem ser saborosas, pois bandos de aves tropicais — fio-fio, Elaena Albiceps — viajam mais de 3500 km até Hornos para nidificar e encher o papo de Canelo.

Fio-fio – Copyright©2010 Flavio Camus

As correntes fortes no Hornos, os açoites de vento, as ondas altíssimas justificam-lhe o apelido de Cementerio Marítimo. Contam-se 800 naves desaparecidas com tripulação de, pelo menos, 10 mil marinheiros! Pelas condições de chuva, neve, granizo também chamam-no Cabo de las Tempestades e Cabo Donde se Acaba el Mundo. Em determinados momentos, deu para avaliar, minimamente, a força destas águas: o vento de 90 km/h nos impediu de abrir a porta da cabine para a varanda!

Cabo Hornos – Copyright©2014-2016 Sidetracked Travel Blog

Por essas e outras, escolhemos o grande navio MS Zaandam da Holland-America. É confortável, oferece concertos de piano e violino, música dançante, cassino, piscina, academia, pista de cooper, jogos de xadrez, bridge, além de fina gastronomia. A convidativa biblioteca tem mesas para quebra-cabeças coletivos que se tornaram um ponto de encontro nos finais de tarde. O lounge tem uma privilegiada vista panorâmica.

Lounge, MS Zaandam – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Tais navios são equipados com estabilizadores e, assim, pode-se minimizar a temida “gangorra” destas águas. Nos navios menores as histórias de seasickness/enjôos desta travessia não são animadoras. Numa viagem transoceânica, de Valparaíso à Austrália, a médica do navio, com bom humor, nos resumiu dois momentos deste incómodo:

inicialmente o passageiro pensa que vai morrer; depois, o pior: ele sabe que não vai morrer!

Com a abertura do Canal do Panamá em 1914, a navegação é praticamente de entretenimento e desportiva; são desafiadoras as competições entre solitários e experientes navegadores que se lançam numa tentativa de circumnavegar o globo terrestre. Para os aficcionados, contornar este cabo, onde Atlântico e Pacífico se encontram, equivale a atingir o cume do Everest.

Curiosa a aventura de um casal inglês em 1956; numa tentativa de contornar o Hornos do Pacífico para o Atlântico, o veleiro Tzu Hang naufragou. Não desistiram; no ano seguinte, lá vão eles! Novo naufrágio… mais uma vez, salvos miraculosamente. É… o Hornos não os quis lá!