Jean-Yves Leloup: Os pés

Observando os pés podemos sentir se há problemas: são muito frágeis, há ferimentos ou marcas, os odores são agradáveis ou não; os pés podem responder as questões sobre o prazer de viver, de sentir prazer e amar. Há pessoas que nunca sentem prazer. Esta sensação é dificil para elas.

Os pés são raízes; se recebemos raízes talvez possamos transmiti-las aos outros. Os pés têm plantas; a “planta dos pés” clama por raízes:

— de onde venho? Nunca me sinto em meu lugar? É dificil, para mim, ter os pés na terra? O meu mundo não é a minha pátria, minha mátria… É necessário reencontrar os nossos dois pés, os dois pés na terra…

Para o psicólogo Paul Diel, o pé é o símbolo da nossa força. É o suporte para permanecermos eretos.

Hermes, o mensageiro dos deuses, tinha os pés alados. Esta simbologia é a da individuação. Podemos passar do pé de Édipo – do grego Οauuδίπους, ter tornozelos inchados – para o pé alado de Hermes. É o caminho da transformação!

Os cuidados, os banhos, as massagens ajudam a escorrer as fadigas e tensões dos pés, para as pessoas doentes é um verdadeiro alívio.

Se escutam a terra, os pés nos enraizam. Na África, o pé é o ponto de apoio do corpo no mundo. É um símbolo de poder. Se os pés estão bons, a cabeça funciona bem.

E Leloup conclui: o equilíbrio do corpo depende de nossas raízes, se o enraizamento é sadio, toda a árvore é sadia!

(vide resenha anterior de O Corpo e Seus Símbolos)

A Cabana

Penso ser preocupante este livro, de W. P. Young, ocupar o primeiro lugar em vendas na última semana na lista da Livraria Leitura.

Certamente o marketing de promoção do tal é o melhor do mundo! Conseguiu uma vendagem extraordinária para um livro medíocre. Há tantos livros nacionais mais úteis, mais divertidos e substanciosos.

A Cabana foi reescrita quatro vezes antes de ser recusada por 26 editoras. Finalmente, dois produtores de cinema criaram uma editora e, então, publicaram o barraco (ops!).

A primeira parte tem enredo razoável, mas o desenrolar da visita ao casebre é piegas; o consolo é uma sequência de chavões e duvidosas respostas de cunho religioso; a solução do crime é um mix de revelação sobrenatural, adivinhação e muitas coincidências… inclusive a conservação de indícios por um tempo longo.

Há quem diga que é um livro “para os sofredores”; gosto não se discute… lamenta-se.

Outros o indicam como auto-ajuda, parece ser este o grande lance marqueteiro: o livro trará a receita para todos os males da tristezas…

Para as Erínias, o sofrimento, às vezes, é inevitável, mas o masoquismo é opcional!

Os bons livros de “auto-ajuda” são os de Amyr Klink, família Schürmann, Oliver Sacks, Guimarães Rosa, João Ubaldo Ribeiro, Arnaldo Jabor, Isabel Allende e outros maravilhosos! 😉

São depoimentos corajosos e inspiradores, idéias inteligentes; pessoas que escolheram o próprio caminho e assumiram as responsabilidades.

Este livro é puramente comercial; nisto foram muitos bons; inclusive criaram um site de relacionamento com “Missy”, a personagem desaparecida… …argh!

Doris Lessing

Sou assaltante de livros: se a vítima está nas mãos de um amigo sem tempo para ler ou aguardando o próximo final de semana para isso, zás! tomo-o de assalto e cumpro o prometido, devolvo o volume encapadinho dois dias depois.

O último butim foi As Avós de Doris Lessing, inglesa, nascida na antiga Pérsia, de 91 anos.

O livrinho (os autores devem se arrepiar com o diminutivo) somente pelo volume bem fino, é instigante, profundo. Descreve um invejável estado de felicidade e a solução amorosa dos amantes incomuns.

Mostra, com maestria, o emaranhado das relações humanas, assim como quem não quer nada… sem lições… sem propósitos… Lessing se dá ao luxo de, às vezes, deixar no ar frases do diálogo!

Do assunto “avós” passa longe. Li, reli. Ao terminar voltava ao início consecutivamente.

A cada leitura um novo ângulo, um outro lado do personagem, uma faceta não apreendida…

Quem já aprendeu a ler subtextos enxerga a interpretação que Lessing dá ao esquecido adágio “os incomodados que se mudem”. É que, nos triângulos desamorosos, quando a pessoa tem a sensacão de não pertencer ao grupo, à tribo, ao mundo do parceiro e não sente ter importância naquele ninho, se tiver auto-estima, bate em retirada! Irá buscar o seu lugar afetivo longe dali, sem exigências, sem “indenizações”.
Se, ao contrário, for ressentida e invejosa tentará destruir o parceiro, o grupo, a tribo… não importam as feridas, os golpes, ainda que na própria pele… Lessing demonstra, com lucidez, estas duas escolhas.

Este é apenas um dos insights que o livro provoca… há muitos outros… descubra-os!

Luis Fernando Veríssimo

Ver!issimo (Comédias Brasileiras de Verão)

Nestas linhas, o nosso mais bem humorado escritor ( o bom humor é sinal explícito de inteligência!) se esmera e vai fundo na carência das relações humanas:

O mistério

Ou como dizia aquele samba do Nelson Sargento, numa adaptação livre:

Nosso amor é bonito.

Ela finge que me ama e que todos os seus orgasmos são múltiplos, espasmódicos, gloriosos, com fogos de artíficio, revoada de pombos e a orquestra dos Fuzileiros Navais em uniforme de gala.

E eu finjo que acredito.