Os Portões de Ferro — Sérvia

Danúbio Sérvio cava o maior canion — 134 km! — da Europa, entre os Montes Cárpatos e os Balcãs em direção à Romênia. Esta passagem chega a, apenas, 150m de largura em determinados trechos. É um legado histórico da idade da pedra, do império romano e de ocupações recentes.

Mosteiro Mraconia, Danúbio – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Neste trecho do Danúbio, de Golubac (Голубац) até Negotin (Неготин), a correnteza muito forte, os redemoinhos, as corredores e enormes pedras submersas eram um tormento para os navegantes.

Portão de Ferro, Danúbio – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Desde Tiberius, 33 d.C., Trajano, 103 d.C. até 1834, houve frustrados projetos e tentativas para superar os obstáculos nesta travessia. Finalmente, em 1964, o megaprojeto das hidroelétricas “Portões de Ferro/Iron Gates”, entre Romênia e Iugoslávia, iniciou a construção de barragens e eclusas. O Danúbio foi transformado em um gigantesco reservatório: meio rio, meio lago.

Portão de Ferro, Danúbio – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Para os navios, não há mais impedimentos, mas tal interferência trouxe amargos resultados para a população ribeirinha, fauna e flora:

  • a imediata interrupção da rota de reprodução para uma espécie de salmão;
  • a bela ilha turca Ada Kaleh afundou-se para sempre, com sua mesquita e o mosteiro franciscano;
  • a parte antiga de Orșova, a cidade romena, foi inundada;
  • a má distribuição das águas prejudica os países rio abaixo, tornando o delta, em certas épocas do ano, intransitável pelo nível baixo.

Fato histórico relevante é o massacre em Kragujevac (Крагујевац), a primeira capital, o maior centro educacional da Sérvia. Aqui, em outubro de 1941, adolescentes e professores do ginásio foram executados em massa, ainda que a população não tivesse participado de qualquer ataque aos servidores de Hitler. O acervo do Parque Memorial de Šumarice e as impressionantes esculturas são uma homenagem viva às vítimas e um veemente ALERTA!

Voltando à beleza presente da paisagem, as ruínas e o marco da ousada Ponte de Trajano. Aí, do lado romeno, a face de Decébalo esculpida recentemente.

Portão de Ferro, Danúbio – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Hoje, esta é uma rota de prazeres ao ar livre bem aproveitada por ciclistas, pescadores, veleiros… as vilas hospitaleiras servem rica culinária, fruto da influência secular de outros povos.

Portão de Ferro, Danúbio – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Um Tesouro Húngaro

Esztergom é, antes de tudo, a sua belíssima Basílica! Um verdadeiro tesouro cultural e histórico.

Esztergom – Copyright©2013 Hungary Taxi

Esztergom foi a capital da Hungria por dois séculos até a mudança para Buda, pelo Rei Béla IV, em meados do Séc.XIII. Os primeiros povos nesta região foram os celtas em torno de 350 a.C..

Esztergom, a primeira arquidiocese da Hungria, teve a mais antiga e próspera comunidade judia. No final da Segunda Guerra suas lojas foram confiscadas, os judeus executados em massa. Em todos os tempos, a intolerância trouxe sofrimento e morte. É forçoso concordar com José Saramago:

…o homem, sendo indubitavelmente um animal entre os animais, é, também, o mais irracional entre todos eles. [Cadernos de Lanzarote, 13/05/93]

Devastada pela guerra, Esztergom foi se recuperando; tornou-se um importante centro cultural e industrial. Ainda hoje, as escavações arqueológicas continuam…

De longe as torres sinalizam a imponência de todo o complexo arquitetônico. Emocionantes os sons dos enormes sinos ultrapassando as margens do Danúbio.

Esztergom, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

A Basílica, em mármore de todas as tonalidades…

Basílica Esztergom, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

…é um repositório de arte sacra.

Basílica Esztergom, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Aqui está sepultado o Cardeal József Mindszenti, o corajoso arcebispo de Esztergom, ferrenho opositor do domínio soviético, lutou em defesa dos oprimidos e da liberdade de culto.

O preço foi muito alto: preso, torturado, o cardeal recebeu asilo político na embaixada americana em Budapest, onde permaneceu por 15 anos. O mais longo cativeiro em embaixadas de que se tem notícia. Sob veementes protestos do mundo civilizado, o íntegro József Mindszenti foi libertado. Impedido de permanecer na pátria amada, exilou-se em Viena. Morreu 4 anos depois. Sua vida inspirou os filmes Guilty of Treason – 1950 e The Prisoner – 1955.

Hoje é venerado como um mártir. O seu exemplo tornou Esztergom um celeiro de vocações sacerdotais, que cresceram exponencialmente depois do comunismo. O seminário Pietati et Scientiis é o maior da Europa.

Os concertos neste órgão atraem visitantes de todas as partes.

Basílica Esztergom, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Do lado de lá do Danúbio, na Eslováquia, a cidade de Štúrovo. A ponte unindo as duas cidades foi destruída pelos alemães em 1944. A reconstrução levou 50 anos, sendo inaugurada em 2004; será um símbolo de um futuro comum sem fronteiras severas? A ponte Mária Valéria é uma beleza por si só, cheia de pedestres e ciclistas. A ligação entre Hungria e Eslováquia faz renascer a teimosa esperança de que haja, em cada um de nós, boa vontade!

Esztergom, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

A Cidade-Fênix — Hungria

Visegrád é uma cidadela a 350m morro acima! Destruída pelos mongóis e pelos turcos, ficou soterrada por mais de um século. Hoje descortina-se daqui este panorama do “Joelho do Danúbio” — Donauknie ou Danube Bend.

Visegrád, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Visegrád é um nome eslavo para uma antiquíssima fortaleza e residência de reis húngaros a partir de 1240. Por aqui foram encontrados traços humanos desde a idade da pedra. Foi fundada em 1009.

Visegrád, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Neste ponto estratégico do Danúbio, o rei húngaro Béla IV construiu a cidadela. Compensadora a maratona dos degraus até aqui, no alto da fortificação.

Visegrád, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Os seus sucessores acrescentaram o palácio, outras ampliações e renovações em estilos gótico e renascentista. Assim, na parte mais baixa, a torre de Salomão — 1258 — em forma hexagonal é imponente, tendo uma pitada exótica por ter aprisionado Vlad Țepeș, o Drácula.

Visegrád é mesmo uma Fênix — a ave da mitologia grega que renasce das próprias cinzas. Os húngaros reconstruíram-na após a invasão mongol. O cruel império Otomano ocupou a região entre 1544 e 1685; todo o complexo foi destruído, ficando soterrado até 1867, quando começaram as escavações e a restauração das edificações. Podemos constatar o admirável avanço arquitetônico ainda do Séc.XIII.

Visegrád ©2009 Hungarian Tourism PLC

Nas imediações, percorremos vilas antigas e bem conservadas, onde moraram, por muito tempo, alemães, russos e ucranianos. É reconfortante pensar que, pelo menos, houve um lugar onde a convivência pacífica entre os vizinhos era o valor mais importante do que cor, etnia ou credo.

Hoje o vilarejo Visegrád, a 40km de Budapest, com menos de 2000 habitantes, tem bons hotéis e agradáveis termas onde a gente recupera a alma!

Visegrád, Lepence Spa – Copyright©2015 Mr. Zsezo

Budapest — Hungria

Budapest é lindíssima, elegante e culta, sendo indescritível o melhor é vir cá… um lugar inesgotável. Fazendo uma exceção às grandes capitais, voltaria mil vezes em mil vidas…

Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

O Danúbio desliza em direção a Budapest. É uma boa oportunidade para ler, na pequena e silenciosa biblioteca do Rousse Prestige, sobre a cultura búlgara. A contribuição da Bulgária ao mundo das artes é riquíssima, com as mais variadas manifestações desde a antiguidade. O recreio, todas as tardes, é acompanhado de café, bolos e tortas deliciosos. Uma tentação!

Pela manhã, aportamos em Komárno/Komárom, uma cidadinha muito agradável de 1215.

Komárno, Eslováquia – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Situa-se entre a Eslováquia e a Hungria; daí o uso simultâneo das duas línguas. É uma novidade a diferença dos sons.

Komárno, Eslováquia – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Ao entardecer, assistimos no deck Budapest vir surgindo bem devagarinho; os subúrbios, os palácios…

Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

…as esculturas encarapitadas nos morros arredondados e as pontes!

Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Intrigantes obras de engenharia, as pontes denominam as partes de Buda e Pest; são, também, uma amostra da arte que permeia toda a cidade.

Finalmente, o parlamento; surpreendente, como se fosse a primeira vez! Chega a ser irreal sob o lusco-fusco…

Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Rousse, depois de uma baliza precisa, com milimétricas manobras, ancora em um cais do centro e ficamos por três dias. Desta vez, subimos ao Monumento da Vitória — uma escultura da deusa Nike (nome grego, pronuncia-se “NÍque”) — e, lá de cima, uma visão panorâmica.

Monumento da Vitória, Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

A cidade parece cuidar bem do meio ambiente. O Monte Janos é coberto de floresta; uma área muito agradável delimitada para passeios a pé, de bicicleta e a cavalo.

János Hegy, Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

No topo, Erzsébet-kilátó, a Torre “Sissi” — aquela dos filmes — construída em 1911 e restaurada em 2005.

Erzsébet-kilátó, Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

teleférico Libegő proporciona uma divertida volta à cidade.

Zugligeti Libegő, Budapest, Hungria – Copyright©2015 Rainer Brockerhoff

Maravilhoso e invejável exemplo é a tolerância zero para a combinação volante-e-bebida. Pelas leis húngaras — sim, são cumpridas! — o carro é apreendido imediatamente quando o bafômetro dá positivo. O motorista faltoso fica suspenso por um tempo, terá de refazer os exames como se fosse a primeira vez, além de pagar pesadas multas. Aqui já está incorporada a bem-humorada idéia:

motoristas podem beber, somente, a “cachaça de gato” — Katzenschnaps — isto é, LEITE!

A propósito, é incompreensível a aceitação passiva e leniente pelo povo e legislação brasileiros das contínuas e criminosas infrações de trânsito.