Andanças — Sikkim, Himalaya

A cerveja típica é a Chhaang ou Tongba. Uma mistura de milhete ou cevada despejada num tubo alto de bambu. Aos poucos, acrescenta-se água quente para absorver o gosto. Degustada lentamente por um canudo, também de bambu, é exótica, elegante e deliciosa!

A magnífica região de Sikkim esconde-se no Himalaya entre Nepal, Tibet e Bhutan, protegida pelo imponente Khangchendzonga.  É a terra dos rododendros inigualáveis — principalmente em Barsey — orquídeas selvagens, picos nevados — o terceiro mais alto do mundo — rios cor de turquesa, majestosas cachoeiras, lagos sagrados, florestas de magnólias, bambus, pássaros raros e milenares mosteiros. Sikkim conversou-se intocada por séculos. Aqui é o lugar onde a terra e o céu se encontram, abençoado pelos lamas tibetanos. O seu povo de natureza dócil é descendente das etnias Lepcha, Limba e Buthia.

O reino de Sikkim passou por períodos turbulentos com invasões dos nepaleses, bhutaneses e a guerra Gurkha/Gorkha em 1841. Isto sem contar as intervenções do império britânico, quase sempre desfavoráveis às colônias e à vizinhança.

A história recente relata fatos que culminariam na desejada anexação de Sikkim — até então um país independente — pela Índia. A versão oficial é a do plebiscito de 1975 favorável à anexação; assim, o belo reino de Sikkim tornou-se o 22º estado indiano. Contudo, a versão do povo e dos jornais da época é bem diferente.

A consulta popular, através de plebiscito, foi organizada a toque de caixa. O resultado favorável à anexação — 97.5% (!) — é duvidoso, segundo fontes históricas e jornalísticas. O livro do conceituado jornalista Sunanda K. Datta-Ray — Smash And Grab — descrevendo este processo de anexação foi banido da Índia. O governo de Indira Gandhi teria manipulado a opinião pública, explorando a divisão étnica entre nepaleses e os nativos, desmoralizando a monarquia e, o mais grave, fraudando o plebiscito!

Entre as reviravoltas políticas, o romance entre o príncipe viúvo P. T. Namgyal, futuro rei/Chogyal, e a jovem americana Hope Cooke é um autêntico conto de fadas.
Eles se conheceram em Darjeeling no exclusivo e elegante Windamere Hotel em 1959, numas férias de verão de Hope. A solidão na infância de ambos os atraiu fortemente.

Hope ficou órfã aos 2 anos. Cresceu com os avós. Gente muito rica mas indiferente e sem calor afetivo. Estudou em bons colégios, é uma pessoa afável e interessante. Escreveu recentemente a autobiografia Time Change.

Casaram-se em 1963 num mosteiro real em Gangtok, sob as bençãos de 14 Lamas. A noiva, com um vestido de seda de Benares, um cinto de ouro com uma adaga e demais acessórios de pedras preciosas, percorreu o templo sob o som de trombetas tibetanas, toque de címbalos e cantochão dos Lamas.

A jovem rainha se interessou pela cultura do país, envolveu-se em programas educativos, melhorando a condição das crianças em idade escolar. Eles foram muito felizes… mas o conto de fadas não resistiu aos sérios problemas políticos. Com a anexação, o rei foi deposto e Hope voltou aos Estados Unidos com os filhos, onde mora até hoje. O 12º e último rei de Sikkim morreu com câncer em 1982, finalizando uma auspiciosa dinastia iniciada em 1642.

Este retorno ao passado é ao redor do Chhaang saboroso, aqui em Gangtok, a capital, nosso próximo post.